"Na hora que eu vi, eu já sabia que não tinha como reparar aquele fato. Não adiantava eu ficar me lamentando", disse Rogéria. "A minha maior dificuldade é em casa, em fazer as coisas da casa. No início foi muito difícil, mas agora a gente vai se acostumando".
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Desde 2022, quando começaram a ser registrados os acidentes, ocorreram ao menos sete amputações de pernas, braços e dedos e duas mortes. No ano seguinte, ao menos outras duas amputações foram identificadas pela Secretaria de Saúde do Espírito Santo. O estado é responsável por 67% da produção nacional de café conilon.
Outro caso aconteceu com o trabalhador rural Pablo Henrique Souza Fabem, de 24 anos, que aparece na foto do celular no início desta reportagem. No dia do seu acidente, em junho de 2022, a lona estava mais pesada e difícil de ser presa ao cilindro porque o café estava molhado pela chuva do dia anterior. Por isso, Pablo e o dono da propriedade amarram uma corda na lona para dar aderência ao material.
"Foi tudo muito rápido. A corda e a lona enrolaram na perna dele e ele foi puxado para dentro da máquina", explica Claudio Rizzo, dono do Sítio Santa Luzia, em Nova Venécia (ES), onde o acidente ocorreu. O produtor correu para desligar o equipamento – que não tinha nenhum sistema de travamento imediato – mas já era tarde. "A perna dele foi decepada na hora e ele ficou todo ferido por dentro", lembra.
Pablo foi transferido para o hospital Roberto Arnizaut Silvares, em São Mateus, município de referência na região, mas não resistiu e morreu no dia seguinte.
João dos Santos, enfermeiro do hospital, contou que, no ano da morte de Pablo Fabem, a unidade atendeu outros 11 trabalhadores que sofreram acidentes na recolhedora de café. "O mais comum eram lesões nas falanges [ossos que formam os dedos das mãos]. Em alguns casos mais graves, foi necessário realizar o amputamento", explica.
A cerca de 500 metros do Sítio Santa Luzia mora a viúva do trabalhador, Beatriz Fabem, de 23 anos. Ela era casada há 6 anos com Pablo quando aconteceu o acidente. Assim como ele, Beatriz é trabalhadora rural e colhe café e pimenta em propriedades da região. "Eu não sei bem o que aconteceu. Cada um diz uma coisa: que ele passou mal, que ele se enroscou na corda. Eu só sei que foi durante o trabalho com essa máquina", diz.
Depois do acidente, Beatriz não recebeu indenização mediada pela Justiça. Mas em um acordo informal com dono da propriedade onde ocorreu o acidente ela ganhou a casa onde mora, no valor de R$ 30 mil, e o equivalente a R$ 12 mil pela venda de uma área de pimenta que pertencia ao produtor. Ele é parente do pai de Beatriz.
À reportagem, a jovem mostra algumas fotos de Pablo. Em uma delas, sua preferida, ele aparece sorridente segurando a sobrinha no colo. "Ele sempre foi muito querido e trabalhador", conta a mãe de Beatriz.
Edição: Bruna Borges