A Justiça Federal no Rio de Janeiro determinou que os pais de uma estudante de 11 anos do Colégio Pedro II vacinem sua filha contra a covid-19. A mãe da menina havia pedido na Justiça um habeas corpus preventivo para impedir o colégio de exigir a vacinação para a filha frequentar as dependĂȘncias escolares, no campus de Realengo, zona oeste do Rio de Janeiro.
A mãe Andressa da Conceição Vasconcelos Bento Nogueira alegou que a exigĂȘncia da vacina seria um cerceamento do direito da criança de estudar, "sendo, desta forma, impedida de exercer sua liberdade de ir, vir e permanecer na instituição escolar da qual faz parte".
No pedido, ela diz também que a carteira de vacinação da menina estĂĄ em dia, mas que a vacinação contra a covid-19 não é obrigatória e que, portanto, "os responsĂĄveis da paciente [aluna] não permitiram que a mesma participasse do experimento vacinal contra covid-19 para protegĂȘ-la de futuros problemas, pois o experimento ainda não apresenta garantias e nem segurança para quem faz uso".
Na decisão, com data do Ășltimo dia 3, a juĂza Mariana Preturlan, da 26ÂȘ Vara Federal do Rio de Janeiro, argumentou que o habeas corpus se refere ao direito de ir e vir, e não ao acesso à educação e saĂșde. Portanto, não é o instrumento correto para tal alegação. Porém, a magistrada analisa o mérito da questão, tendo em vista a "relevância do tema - vacinação de criança em uma pandemia".
Entre os argumentos jurĂdicos, Mariana Preturlan apontou que a Lei Federal nÂș 13.979, de 6 de fevereiro de 2020, autoriza a vacinação compulsória para enfrentar a pandemia, bem como a imposição de sanções para quem se recusar. Medida que foi confirmada como constitucional pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
"No julgado, fica claro que a vacinação compulsória não é vacinação forçada, isto é, é possĂvel a recusa do usuĂĄrio, que, no entanto, fica sujeito a sanções e medidas indiretas de convencimento, tais como a restrição de acesso a locais ou exercĂcio de atividades", esclarece a sentença.
A juĂza lembrou, também, que as vacinas aplicadas nas crianças foram aprovadas pela AgĂȘncia Nacional de Vigilância SanitĂĄria (Anvisa), "de forma que não se pode falar em uso experimental dos imunizantes", bem como a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) reforça a importância da vacinação infantil para combater a pandemia, método jĂĄ utilizado em larga escala em outros paĂses.
"Existe, portanto, amplo consenso cientĂfico de que a imunização de crianças, inclusive da faixa etĂĄria de 5 a 11 anos, colabora com a mitigação de formas graves e óbitos por covid-19 nesse grupo, reduz a transmissão do vĂrus e é uma importante estratégia para que as atividades escolares retornem ao modo presencial", afirmou a juĂza.
Ela citou que é dever do Estado, da famĂlia e da sociedade assegurar os direitos fundamentais das crianças e que, portanto, "os pais não tĂȘm direito de impedir seus filhos de serem vacinados", sob o risco de perda do poder familiar.
"Diferentemente do alegado pela impetrante, os fatos narrados na petição inicial não noticiam que o Colégio Pedro II estaria violando direitos da paciente. Pelo contrĂĄrio, os fatos narrados revelam que os pais da paciente estão violando seus direitos fundamentais à saĂșde e à educação. A petição inicial é, portanto, notĂcia da prĂĄtica de ilegalidade pelos genitores da paciente", concluiu a juĂza.
Ela determinou que o Ministério PĂșblico e o Conselho Tutelar sejam acionados para tomar as medidas cabĂveis contra os pais da estudante e resguardar o direito da menina de ser imunizada contra a covid-19.
"Assim, considerando as atribuições legais do Ministério PĂșblico do Estado do Rio de Janeiro e do Conselho Tutelar, determino sejam os órgãos oficiados da presente impetração e desta sentença, a fim de que sejam tomadas as medidas necessĂĄrias para resguardar os direitos da menor absolutamente incapaz, que estĂĄ sendo ilegalmente impedida de se vacinar e, possivelmente, de frequentar a escola", explicou.
A exigĂȘncia da comprovação de vacina para frequentar as dependĂȘncias do Colégio Pedro II foi determinada em novembro pelo Conselho Superior (Consup). O colégio é federal e tem uma rede de 14 campi e um Centro de ReferĂȘncia em Educação Infantil, distribuĂdos em seis bairros do Rio de Janeiro e nos municĂpios de Duque de Caxias e Niterói, atendendo cerca de 13 mil estudantes, da educação infantil à pós-graduação.
O Consup é presidido pelo reitor e reĂșne representantes dos professores, trabalhadores técnico-administrativos, estudantes, pais de alunos, egressos, conselho de dirigentes e um representante do Ministério da Educação.
A Resolução nĂșmero 183 do Consup, de 12 de novembro de 2021, detalha as "premissas fundamentais para a retomada das atividades presenciais". Entre elas, a determinação de que "para entrada na instituição serĂĄ exigida a carteira de vacinação de todos os que tenham sido contemplados pelo calendĂĄrio de vacinação".
Na semana passada, o reitor Oscar Hallac emitiu nota pĂșblica se posicionando favoravelmente à vacinação das crianças de 5 a 11 anos contra a Covid-19.
"Rogo que vacinem seus filhos e filhas de 5 a 11 anos e complementem as suas vacinações. Assim, a normalidade advirĂĄ mais rĂĄpida e estaremos cuidando uns dos outros", afirma nota do reitor.
O Colégio Pedro II retoma as aulas na segunda-feira para encerrar o ano letivo de 2021, de forma hĂbrida. A previsão em dezembro era de que as aulas retornariam 100% presenciais em fevereiro, porém, o avanço da variante Ômicron fez com que o Consup decidisse pelo adiamento do retorno pleno às salas de aula.
Edição: Kleber Sampaio