Morre, no Rio, o filho do poeta piauiense Da Costa e Silva, Alberto Costa e Silva; se dizia piauiense de coração

O escritor venceu o Prêmio Camões em 2014 e é um dos principais especializados em África e suas relações com o Brasil.

Por Portal O Piauí em 27/11/2023 às 13:50:57
O diplomata era um dos maiores especialistas em cultura africana

O diplomata era um dos maiores especialistas em cultura africana

O acadêmico, diplomata, poeta, ensaísta, memorialista e historiador Alberto Costa e Silva morreu na madrugada deste domingo (26), em casa, de causas naturais, aos 92 anos. De acordo com a Academia Brasileira de Letras (ABL), não haverá velório, e o corpo será cremado amanhã em cerimônia restrita à família.

Especialista na cultura e na história da África, Costa e Silva foi embaixador do Brasil na Nigéria e no Benin, e é considerado um dos mais importantes intelectuais brasileiros. "Sua obra é fundamental para o desenvolvimento dos estudos e do ensino da história do continente africano. Escreveu mais de 40 livros, entre poesia, ensaio, história, infantojuvenil, memória, antologia, versão e adaptação", diz a ABL em nota sobre a morte do acadêmico.

Alberto Costa e Silva, ao centro, era filho do poeta piauiense de Amarante, Da Costa e Silva; considerava-se um piauiense de coração, onde foi homenageado com a Ordem Estadual do Mérito da Renascença do Piauí.

Eleito para a ABL em 2000, foi o quarto ocupante da cadeira nº 9, na sucessão de Carlos Chagas Filho. Alberto Costa e Silva foi presidente da Academia no biênio 2002-2003 e ocupou os cargos de secretário-geral em 2001, primeiro secretário em 2008-2009 e diretor das Bibliotecas em 2010-15. Era também sócio correspondente da Academia das Ciências de Lisboa e da Academia Portuguesa da História. A diplomação no Instituto Rio Branco ocorreu em 1957.

O acadêmico nasceu no dia 12 de maio de 1931, em São Paulo, e fez os estudos primários e o curso secundário foram em Fortaleza. Em 1943, mudou-se para o Rio de Janeiro.

No discurso de posse na ABL, destacou a sua brasilidade. "Carlos Chagas Filho desejou para esta cadeira que fosse uma 'cadeira cativa' carioca. Não o desapontará de todo estar eu aqui. Meu pai era de Amarante, no Piauí, de mãe maranhense, e estudou no Recife; minha mãe era de Camocim, no Ceará, criada em Manaus; tive um irmão carioca e dois mineiros, um deles educado em São Luís do Maranhão; de minhas irmãs, uma nasceu no Amazonas e a outra no Rio; deixei de ser gaúcho por três meses e fui nascer em São Paulo. Se me considero piauiense de coração, ancorado, pela infância, em Fortaleza, acabo de esboçar a ficha pessoal e familiar de um verdadeiro cidadão do Rio de Janeiro, cujas velhas ruas mais de uma vez percorri na companhia de um dos mais fraternos de meus amigos, Herberto Sales, e de um de seus amigos mais fraternos, Marques Rebelo."

África

O interesse de Costa e Silva pela história da África foi despertado pelos livros Os Africanos no Brasil, de Nina Rodrigues, e Casa Grande e Senzala, de Gilberto Freyre. No início da carreira diplomática, fez a primeira viagem à África, como integrante da comitiva do então ministro das Relações Exteriores, Negrão de Lima, representante do Brasil nas cerimônias de independência da Nigéria, em 1960. "Desde então seu interesse pelo continente, conhecido pelos que com ele conviviam, fez com que fosse designado para missões na África", disse a historiadora Marina de Mello e Souza.

Condecorações

Entre as condecorações que recebeu no Brasil estão a Grã-Cruz da Ordem de Rio Branco; Grande Oficial da Ordem do Mérito Militar; Grande Oficial da Ordem do Mérito Aeronáutico; Comendador da Ordem do Mérito Naval e Comendador da Ordem do Mérito Cultural. Fora do país, entre outras, recebeu em Portugal a Grã-Cruz da Ordem Militar de Cristo; Grã-Cruz da Ordem Militar de Santiago da Espada; Grã-Cruz da Ordem do Infante Dom Henrique; na Colômbia, Grã-Cruz de Boyacá; comendador da Ordem de San Carlos; na Espanha, comendador com placa da Ordem de Isabel, a Católica; e, na Itália, Grande Oficial da Ordem do Mérito.

Lula e imortais

Em mensagem na rede X (antigo Twitter), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, manifestou pesar com o falecimento do diplomata, ensaísta, historiador e um dos mais importantes conhecedores da África no Brasil, Alberto Costa e Silva.

"Membro da Academia Brasileira de Letras, teve um papel fundamental na necessária aproximação entre o Brasil e o continente africano, de onde nutrimos nossas origens e em cuja ancestralidade alimentamos os nossos saberes. Sobre o rio chamado Atlântico, que Alberto identificou, seguiremos construindo as pontes que ele sonhou", escreveu o presidente. "Meu abraço solidário aos filhos, netos e todos os familiares de um dos mais importantes intelectuais brasileiros no século XX."

Para o presidente da ABL, Merval Pereira, a morte de Alberto Costa e Silva tem efeitos múltiplos, todos negativos para a cultura brasileira, que perde um dos seus maiores intelectuais de todos os tempos.

"Para o estudo da África, Alberto foi um dos maiores, senão o maior africanólogo brasileiro. Tinha uma dimensão histórica e política sobre nossas relações com a África, e dava a importância que ela sempre teve, mas nunca foi devidamente enaltecida como ele fez em seus livros. Ganhou o Prêmio Camões, o maior prêmio da língua portuguesa por esta especificação da importância da África no desenvolvimento brasileiro. Era um grande poeta, grande intelectual, grande diplomata. Internamente, nós, da ABL, perdemos uma de nossas bússolas. Alberto dava a direção e a solução correta quando tínhamos dúvidas. É uma perda que tem consequências graves para a ABL, para a cultura brasileira e para o Brasil como um todo", afirmou o jornalista.

João Almino também lamentou a morte do amigo. "Uma inestimável perda para a ABL e o Brasil do grande homem que foi Alberto Costa e Silva, como diplomata e como intelectual, historiador e africanista, reconhecido dentro e fora do Brasil, com uma obra sólida na ficção, na poesia e no ensaio. Presença marcante nas reuniões da ABL enquanto sua saúde permitiu, sempre guardaremos as melhores recordações de sua vasta cultura e de seu humor", disse.

O acadêmico Arnaldo Niskier destacou a atuação impecável de Alberto Costa e Silva na ABL. "Sua presidência na Casa de Machado de Assis foi simplesmente histórica! Estivemos com ele ao lado de sua querida Vera na Embaixada do Brasil guardando até hoje esses momentos felizes. Como historiador e africanista, deixou um excelente trabalho. Sentiremos muito a sua falta."

A escritora Ana Maria Machado disse que, apesar de saber que o colega vinha enfrentando problemas graves de saúde e se apagando aos poucos, a morte do amigo representa para ela uma tristeza imensa. "Eu gostava imensamente dele, foi um privilégio ter convivido de perto com Alberto durante anos, um dos responsáveis diretos por minha entrada para a ABL."

Segundo a acadêmica, além do historiador e africanólogo "incomparável e exemplar", a quem o mundo tanto deve, e o Brasil nunca louvará suficientemente, Alberto Costa e Silva foi bom poeta e excelente memorialista. "Capaz de abrir mão de vaidades individuais em seus escritos e evocar com acuidade e precisão ambientes, costumes e pessoas do passado, personalidades importantes com quem conviveu, detalhes preciosos dos bastidores do poder."

Para Cacá Diegues, o colega foi um irrepreensível membro da academia. "Sua morte deixa um imenso vazio no espírito da ABL, é uma ausência grave entre nossos especialistas: ninguém no Brasil possui o conhecimento da África como ele o possuía, ninguém sabia mais sobre a história e a economia daquele continente, ninguém era tão íntimo da cultura popular africana como ele. Vamos levar muitos anos, quem sabe, décadas, para formar um outro especialista em África como Alberto Costa e Silva! O luto da ABL é total e irreparável. E o do Brasil também", completou.

Itamaraty

Em nota, o Ministério das Relações Exteriores (MRE) informou, com grande pesar, o falecimento do embaixador Alberto Costa e Silva. "Como diplomata, ocupou relevantes funções em Brasília, entre elas a de chefe do Departamento Cultural (1983-1984), a de subsecretário geral de Administração (1984-86) e a de Inspetor do Serviço Exterior (1995-98).

Ao longo de uma carreira destacada, no exterior, serviu inicialmente nas embaixadas em Lisboa, Washington, Caracas, Madri e Roma, antes de ser embaixador na Nigéria (1979-83) e cumulativamente em Cotonu, Benin (1981-1983), em Portugal (1986-90), na Colômbia (1990-93) e no Paraguai (1993-95). Sua valiosa e extensa contribuição diplomática o tornou um dos artífices da política externa brasileira para a África", diz o texto.

De acordo com o ministério, Alberto Costa e Silva deixa sete netos, uma bisneta recém-nascida e três filhos, todos vinculados ao Itamaraty: a embaixatriz Elza Maria e os embaixadores Antônio Francisco e Pedro Miguel. "O Ministério das Relações Exteriores expressa à família, aos amigos e aos discípulos do embaixador Alberto da Costa e Silva as mais sentidas condolências", conclui a nota.

Texto ampliado às 13h37 para inclusão de mensagem de pesar do presidente Lula pela morte do acadêmico

Acadêmicos lamentam a morte de Alberto da Costa e Silva

Merval Pereira – a morte de Alberto da Costa e Silva tem efeitos múltiplos, todos negativos para a cultura brasileira, que perde um dos seus maiores intelectuais de todos os tempos. Para o estudo da África, Alberto foi um dos maiores, senão o maior africanólogo brasileiro. Tinha uma dimensão histórica e política sobre nossas relações com a África, e dava a importância que ela sempre teve, mas nunca foi devidamente enaltecida como ele fez em seus livros. Ganhou o Prêmio Camões, o maior prêmio da língua portuguesa por esta especificação da importância da África no desenvolvimento brasileiro. Era um grande poeta, grande intelectual, grande diplomata. Internamente, nós da ABL perdemos uma de nossas bussolas. Alberto dava a direção e a solução corretas quando tínhamos dúvidas. É uma perda que tem consequências graves para a ABL, para a cultura brasileira e para o Brasil como um todo.

João Almino - Uma inestimável perda para a ABL e o Brasil do grande homem que foi Alberto da Cista e Silva, como diplomata e como intelectual, historiador e africanista, reconhecido dentro e fora do Brasil, com uma obra sólida na ficção, na poesia e no ensaio. Presença marcante nas reuniões da ABL enquanto sua saúde permitiu, sempre guardaremos as melhores recordações de sua vasta cultura e de seu humor.

Jorge Caldeira - Mestre maior do gênero que abraçou, grande historiador e querido amigo

Godofredo de Oliveira Neto - A ABL e o Brasil perdem um de seus maiores intelectuais. O mundo perde um dos seus maiores estudiosos da África. E perco um amigo afetuoso e generoso em todos os momentos- alguns difíceis- da minha vida.

Arnaldo Niskier - Alberto Costa e Silva foi um exemplo de imortal dedicado , com uma atuação impecável em favor da Academia Brasileira de Letras. Sua presidência na Casa de Machado de Assis foi simplesmente histórica! Estivemos com ele ao lado de sua querida Vera na Embaixada do Brasil guardando até hoje esses momentos felizes. Como historiador e africanista deixou um excelente trabalho. Sentiremos muito a sua falta.

Ana Maria Machado - Mesmo sabendo que ele vinha enfrentando problemas graves de saúde e se apagando aos poucos, fico numa tristeza imensa. Eu gostava imensamente dele, foi um privilégio ter convivido de perto com Alberto durante anos, um dos responsáveis diretos por minha entrada para a ABL.

Além do historiador e africanólogo incomparável e exemplar, a quem o mundo tanto deve e o Brasil nunca louvará suficientemente, Alberto da Costa e Silva foi bom poeta e excelente memorialista, capaz de abrir mão de vaidades individuais em seus escritos e evocar com acuidade e precisão ambientes, costumes e pessoas do passado, personalidades importantes com quem conviveu, detalhes preciosos dos bastidores do poder.

Na ABL, sempre zelou pelo sentido maior da instituição, eticamente exigente, preocupado com o papel social e histórico da Academia, avesso a imediatismos e privilégios. Foi um acadêmico assíduo, participante, corajoso e dedicado à casa de Machado de Assis, a que serviu sem hesitação. Deixa nela sua marca para sempre.

Arno Wehling - Alberto Costa e Silva foi grande no muito que fez e a tudo se dedicava com entusiasmo, criatividade e empatia.

Como poeta, ficcionista, memorialista e historiador deixou belos exemplos de sensibilidade, inteligência e finura intelectual. O africanista nos deu trabalhos basilares para o conhecimento da África e da presença africana no Brasil. O acadêmico se integrava à instituição e captava como ninguém seu espírito.

Mas, acima de tudo, Alberto nos legou um exemplo de sabedoria e vida profundamente embebido em humanidade.

Evanildo Cavalcante Bechara - Alberto da Costa e Silva foi dos melhores Acadêmicos que já passaram pela Instituição, não somente pela sua contribuição intelectual mas também pelo valor e maestria que soube plantar nos seus amigos". Evanildo Bechara.

Ricardo Cavaliere - Lamento muito, Alberto deixa um legado precioso como poeta, historiador e africanista.

Domicio Proença Filho - Perdi um grande amigo e um mestre excepcional, seguro conhecedor das culturas brasileira e africana.

Antonio Torres - Condoído, abraço afetuosamente os familiares e amigos do imortal Alberto da Costa e Silva, admirável confrade.

Ruy Castro - Perdem a África, o Brasil, a cultura, a Academia e cada um de nós.

Edmar Bacha - Quando Arno deixava, tive muitas vezes o prazer de levar Alberto para casa depois das reuniões, sempre na companhia de José Murilo. Que perda irreparável, mas também que honra de haver desfrutado da companhia desse extraordinário intelectual.

Rosiska Darcy de Oliveira - Diria como o Bacha. Que privilégio ter convivido até o fim com esse intelectual completo. Uma vida bem vivida cujo legado nos consola da perda .

Antonio Carlos Secchin - Associo-me a todas as manifestações de pesar pela perda de Alberto. Além de todos os méritos aqui destacados, foi um exemplo irretocável de amor à Casa.

Carlos Nejar - A solidariedade minha e de Elza aos familiares.Era um grande Poeta e Historiador.Prêmio Camões.Afetuoso Amigo.Não esquecemos sua hospitalidade quando era Embaixador em Portugal. Carlos Nejar.

Cacá Diegues - Alberto Costa e Silva foi um irrepreensível membro da Academia Brasileira de Letras. Sua morte deixa um imenso vazio no espírito da ABL, é uma ausência grave entre nossos especialistas: ninguém no Brasil possui o conhecimento da África como ele o possuia, ninguém sabia mais sobre a história e a economia daquele continente, ninguém era tão íntimo da cultura popular africana como ele. Vamos levar muitos anos, quem sabe décadas, para formar um outro especialista em África como Alberto Costa e Silva! O luto da ABL é total e irreparável. E o do Brasil também.

Heloisa Teixeira - Acompanho as palavras dos confrades sobre a grandeza desse poeta, intelectual e africanista e sobre o tamanho inestimável desta perda para a ABL e para o país. ?

Joaquim Falcão - Alberto pioneiro nos fez conhecer e ter orgulho de nossas raízes africanas.

Zuenir Ventura - Com a morte de Alberto perdemos todos, a Academia e o Brasil.

Geraldo Carneiro - Além de seus feitos como historiador de Áfricas, Alberto da Costa e Silva foi uma pessoa encantadora, de uma generosidade rara. Dizem alguns estudiosos que os orixás são ancestrais divinizados. Se for assim, Alberto é um orixá.

Gilberto Gil – Saudades!

Celso Lafer - Alberto da Costa e Silva, pela sua cultura e pela qualidade das virtudes de seu generoso modo de ser, foi um dos mais destacados membros da Academia Brasileira de Letras, à qual conferiu com sua atuante presença uma indiscutível envergadura no cenário nacional. Destacou-se como inovador historiador que trouxe a África para o nosso país como um campo próprio de conhecimento. Refletiu com originalidade, com seu domínio do mundo lusitano, sobre a língua portuguesa e a nossa herança comum. Foi um poeta de mérito, e um prosador de inexcedível qualidade. Suas memórias são um dos pontos mais altos e originais da memorialística brasileira. Sentimos desde já com o coração, a sensibilidade e a razão, a ausência da sua presença.

José Sarney - É com muita tristeza que escrevo esta nota sobre meu querido amigo Alberto da Costa e Silva, que faleceu nesta madrugada. Fomos amigos por tantos anos! Nos víamos toda hora, Vera, sua mulher, e ele, Marly e eu, enquanto estavam em Brasília. Tínhamos a afinidade da vizinhança de Maranhão e Piauí, terra de seu pai, o poeta Da Costa e Silva, autor de Saudade "Parnaíba — o velho monge / as barbas brancas alongando". Mas também a comum visão do Mundo. Alberto foi um intelectual completo. Grande diplomata, com uma carreira exemplar, era poeta, historiador, memorialista, ensaísta. Sua obra sobre a África — A Enxada e a Lança, A Manilha e o Libambo, Um rio chamado Atlântico, Francisco Félix de Sousa… — é absolutamente indispensável para quem queira entender não só a relação entre o continente e o Brasil, como a própria África, e é referência acadêmica universal. Sua poesia, de extrema sensibilidade, bastava como linhagem. Seus livros de memória, Espelho do Príncipe e Invenção do Desenho, são admiráveis. Para o Brasil, para a Academia sua inteligência fará imensa falta. Mas a família, Marly e eu sentiremos também a ausência afetiva, que mais dói.


Edição: Nádia Franco

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