ONU condena assassinato na Bahia de Mãe Bernadete, liderança quilombola

No comunicado, a ONU Direitos Humanos ressaltou que Mãe Bernadete também estava empenhada na busca da justiça pela morte do seu filho Flávio Gabriel Pacífico dos Santos, conhecido como Binho do Quilombo

Por Portal O Piauí em 19/08/2023 às 12:32:48
Foto: Walisson Braga/Conaq

Foto: Walisson Braga/Conaq

A Organização das Nações Unidas (ONU) condenou o assassinato da liderança quilombola Maria Bernadete Pacífico, Mãe Bernadete, ocorrido nessa quinta-feira (18), no Quilombo Pitanga dos Palmares, no município de Simões Filho (BA). Em um comunicado divulgado neste sábado (19), o escritório regional para a América do Sul da ONU Direitos Humanos manifestou solidariedade com a família e a comunidade e convocou o Estado Brasileiro a realizar uma investigação "célere, imparcial e transparente" sobre o homicídio.

"A ONU Direitos Humanos manifesta sua solidariedade com a família e a comunidade dessa reconhecida mulher negra, quilombola, representante de uma religião de matriz africana e defensora do seu território", diz o comunicado.

Yalorixá, Mãe Bernadete era coordenadora da Coordenação Nacional de Articulação de Quilombos (CONAQ) e ex-secretária de Promoção da Igualdade Racial de Simões Filho. Ela foi morta a tiros em sua casa e terreiro religioso, enquanto assistia televisão com dois netos e mais duas crianças. Ela já vinha denunciando há algum tempo a diversas instâncias governamentais que estava sendo ameaçada de morte.

No comunicado, a ONU Direitos Humanos ressaltou que Mãe Bernadete também estava empenhada na busca da justiça pela morte do seu filho Flávio Gabriel Pacífico dos Santos, conhecido como Binho do Quilombo, também assassinado a tiros em 2017. A nota diz ainda que a Yalorixá sempre denunciou a violência enfrentada pelas comunidades quilombolas.

"A ONU Direitos Humanos convoca o Estado brasileiro a realizar uma investigação célere, imparcial e transparente, e que sejam respeitados os mecanismos de proteção legal para o amparo das comunidades quilombolas, bem como medidas de proteção e reparação para os familiares e a comunidade de Bernadete Pacífico", diz o texto.

"Diante da constante violência, o organismo reforça o apelo pela proteção a lideranças e pessoas defensoras dos direitos humanos. Nesse sentido, chama o Estado a cumprir seu dever de proteger a vida, a integridade pessoal, os territórios, a liberdade religiosa e os recursos naturais desses povos", ressalta o comunicado.

O representante da ONU Direitos Humanos na América do Sul, Jan Jarab também repudiou o crime. "Este crime terrível não pode ficar impune. É um lamentável novo exemplo dos perigos que as comunidades quilombolas enfrentam diante da violência daqueles que ameaçam seus territórios e sua cultura", disse.

Em entrevista à TV Brasil, o filho de Mãe Bernadete, Jurandir Wellington Pacífico, informou que a mãe era ameaçada de morte desde 2016 e avaliou que o assassinato dela é uma consequência da impunidade do assassinato do irmão dele, Flávio Gabriel Pacífico dos Santos.

"É crime de mando, crime de execução, não tem para onde correr, igual ao de Binho do Quilombo", afirmou o filho de Mãe Bernadete. "Eu já perdi meu irmão, já perdi minha mãe, só resta eu, eu sou o próximo", concluiu.

O sepultamento de Mãe Bernadete foi às 11h em um cemitério da capital baiana. Antes, ela foi homenageada com samba, ritual candomblecista e caminhada pelas ruas de Simões Filho, na região metropolitana de Salvador.

Uma comissão interministerial do governo federal acompanha as investigação em Salvador. O governador da Bahia, Jerônimo Rodrigues, determinou apuração rigorosa por parte das polícias Militar e Civil. A Polícia Federal também abriu inquérito para investigar o caso.

Edição: Fernando Fraga

Lula e Rosa Weber lamentam morte de Mãe Bernadete na Bahia

O presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva e a presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) Rosa Weber se manifestaram nesta sexta-feira (18) sobre o assassinato de Maria Bernadete Pacífico, liderança quilombola morta a tiros nesta quinta-feira dentro de casa no Quilombo Pitanga dos Palmares, no município Simões Filho (BA).

Pelas redes sociais, Lula disse que soube do crime com "pesar e preocupação" e lembrou que Bernadete cobrava justiça pelo filho assassinado, em 2017. O filho de Bernadete, Flávio Gabriel Pacífico dos Santos, mais conhecido como Binho do Quilombo, foi assassinado há quase seis anos, no dia 19 de setembro de 2017.

"Bernadete Pacífico foi secretária de Políticas de Promoção da Igualdade Racial na cidade de Simões Filho e cobrava justiça pelo assassinato do seu filho, também um líder quilombola. O governo federal, por meio dos ministérios da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos e Cidadania, mandou representantes e aguardamos a investigação rigorosa do caso. Meus sentimentos aos familiares e amigos de Mãe Bernadete", disse Lula.

O crime também foi lamentado pela ministra Rosa Weber, que esteve com Bernadete a menos de um mês, em 27 de julho. "Mãe Bernadete, que me falou pessoalmente sobre a violência a que os quilombolas estão expostos e revelou a dor de perder seu filho com 14 tiros dentro da comunidade, foi morta em circunstâncias ainda inexplicadas", disse Weber, em nota.

A presidente do STF e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) acrescentou que o crime deve ser esclarecido com urgência, "a fim de que sejam responsabilizados aqueles que patrocinaram o covarde enredo e imediatamente protegidos os familiares de Mãe Bernadete e outras lideranças locais".

Rosa Weber concluiu que "é absolutamente estarrecedor que os quilombolas, cujos antepassados lutaram com todas as forças e perderam as vidas para fugir da escravidão, ainda hoje vivam em situação de extrema vulnerabilidade em suas terras".

Assassinato

A Secretaria de Segurança Pública (SSP) da Bahia disse que as informações preliminares indicam que dois homens, usando capacetes, entraram na casa da vítima e efetuaram disparos com armas de fogo. O órgão pede para que denúncias sobre o caso sejam enviadas, com todo sigilo, ao telefone 181 (Disque denúncia da SSP).

Maria Bernadete era também coordenadora-executiva da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq). A Conaq vinha denunciado ameaças, perseguições e intimações aos moradores do Quilombo Pitanga dos Palmares. Membros da coordenação dizem acreditar que a disputa por terra e água em torno do quilombo tem motivado a violência contra as lideranças locais.

Levantamento da Rede de Observatórios de Segurança, realizado com apoio das secretarias de segurança pública estaduais e divulgado em junho deste ano, já apontava a Bahia como o segundo estado do Brasil com mais ocorrências de violência contra povos e comunidades tradicionais. Atrás apenas do Pará, a Bahia registrou 428 vítimas de violência no intervalo de 2017 a 2022.

Edição: Aline Leal

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